sábado, 31 de julho de 2010

A day in the life



A boca seca. O tempo parece não passar mais. Pela janela pode ver as árvores. Nem uma folha se mexe. Nem ao menos o vento quer passar por ali.
Passou dias a esperar, e continuará assim. Não sabe ao certo se por muito ou pouco tempo, mas continuará esperando.
Olha. Observa. Espera.
Abre espaço para que tudo aquilo que tanto deseja venha à tona. Liberta seus pensamentos da prisão em que costuma deixá-los durante o dia, durante as horas em que precisa enquadrar-se nas normas-padrão.
Levanta-se e tenta ler o jornal. As falsas boas notícias. Não pode se concentrar. Tenta evitar que as ideias voem àquela velocidade. Tem medo de se perder.
Folheia uma revista, liga a TV, o som. Volta ao jornal. Espera que qualquer brisa venha brincar em seus cabelos. Olha para o relógio.
O seu universo já está quase pronto. As personagens começam a chegar e a ganhar vida. Já não pode evitar.
Naquele turbilhão de imagens e cores sente-se, enfim, realizada. Sorri para si mesma. Satisfeita com sua produção, com aquilo que para muitos não bastaria. Para as sensações que somente ali, naquele espaço único, se pode ter.
E decide enfim ler o jornal. As mesmas notícias de ontem e de sempre, com novas maquiagens, afinal, sua mente não está ali. Nunca está.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Um dia de coala


A contagem regressiva começou. A expectativa aumenta. As idéias que foram durante muito tempo guardadas começam a aflorar. E assim seguiu-se o antepenúltimo dia.
O coala Chinês com sua mentezinha quase perversa sonha. Seus sonhos para alguns parecem pesadelos, para outros são apenas absurdos. Para o pequeno marsupial, tão frágil, são a esperança de permanecer vivo, mesmo que seja na lembrança, dele, ou na de alguém.
“Fosse outra época...” chega a pensar. Põe-se a imaginar todas as possibilidades de vida diversa da que leva. Outra vida, onde não estivesse preso tão somente para ser observado. É verdade que lhe admiram, que sorriem quando o vêem, chegam a amá-lo, mas nunca se perguntam se é aquilo mesmo que deseja. Passa seus dias a imaginar, então, a vida que deseja. Não que por vezes deixe de perceber que está feliz. Feliz, essa definição ainda não está completa em seu ser, mas sim, afirma que em muitos dias é assim que se sente.
No entanto, não se esquece de seus sonhos, de seus desejos mais íntimos. Pensa não em tudo o que faria, mas em tudo o que poderia fazer caso vivesse de outra maneira, caso vivesse livre daquela prisão que insistem em chamar de lar, e que, também ele muitas vezes acredita ser seu lar.
No fim de cada tarde, ao descer de sua árvore, local onde passa boa parte de seu tempo, e deitar na aconchegante grama que lhe serve de cama, só lhe resta fechar os olhos e, como um sorrisinho maroto nos cantos dos lábios, sonhar com a vida que um dia, certamente, terá.

sábado, 3 de julho de 2010

O corpo em choque


Você pensa estar preparado. Parece que nada mais poderá te pegar de surpresa.
Você se considera uma pessoa precavida, já passou muitas noites imaginando diversas coisas, boas e ruins, que poderiam acontecer a você ou a pessoas próximas a você.
Nada mais parece te pegar desprevenido...
Até que você olha pela janela da sua casa e toma um susto!!!
A primeira reação é... não ter reação alguma. As pernas começam a tremer, as mãos também e o seu cérebro não processa nada de maneira que você considere coerente. Alguns barulhos à sua volta somem, alguns outros parecem ficar alarmantemente altos.
Os músculos tensos, a respiração acelerada.
Demora um pouco - que te parece uma eternidade - para tudo ir voltando ao normal e você poder dar o primeiro passo rumo à porta e descobrir o que aconteceu.
Vai, lentamente e se perguntando como é que todas aquelas horas de "treinamento" puderam ser tão estúpidas, já que agora, diante do problema real você fica assim...
Aos poucos a respiração volta ao normal. Parece que você enfim retoma o controle sobre você mesmo. Parece.
Quando enfim percebe que as coisas não foram tão ruins quanto poderia ter sido, até é possível sorrir e respirar aliviado, mas tão logo fique sozinho, as mãos perderão - ainda que por alguns minutos - a força habitual.
Qualquer demora no contato parece infinita. Todos os teus contatos parecem off-line e é assim que você gostaria de estar também: in off.
Um contato. Um pouco mais de alívio, e inúmeras idéias estapafúrdias passam pela sua mente quase em branco.
Um café, um cigarro. O relógio. A tv desligada. Só o ronronar de uns gatos, o barulho do PC ligado. Além disso, o silêncio absoluto.
Sábado, três de julho. Um dia verdadeiramente tenso. Um prejuízo grande despejado na garagem. Aquela pessoa aguardando atendimento. Um telefonema atendido. A irmã indo ao casamento não pode falar com você. Mas agora está tudo bem. Espero...